ensaio sobre a perereca
numa roda de chegados, eu, com uma puta dor no
no maxilar superior envolvido por tártaros e um fiapo
de pele de linguiça preso nele.
não queria rir com as piadas e o juca pastel sai com essa:
'o que é maior, uma banda ou uma bunda?' uma bunda --
respondi -- porque a bunda tem duas bandas e um cu junto.
riso total e cerveja nos copos. aí , o juca, pra não ficar por
baixo, novamente me perguntou: como é que você sabe qual a
parte da frente de uma moita ou árvore? pensei, consultei os bebuns,
e nada. então o juca respondeu: 'é fácil, amigos: dê uma volta
em torno da árvore, onde tiver uma cagada é a parte de trás.'
eu ri de chorar, mas a dor de dente continuava me incomodando.
eu estava com o pensamento distante, imaginando aquela
perereca em que ficaria horas e horas passando a língua e
tentando morder num exercício mandibular, vejam.
saí do bar e fui direto ao pronto socorro e extrai o danado.
estou agora com os pontos na boca, divagando sobre a perda
dos meus dentes amarelos, nicotinados. implantes?.. não dá,
não tenho grana pra isso. preciso assumir que estou velho,
perdendo o sorriso natural e daqui uns tempos terei que sorrir
e cobrir a boca com as mãos, envergonhado. ó sina minha!
me vejo chupando rapadura e torresmo... e pensar que eu
descascava cana roxa com os dentes. se já não bastasse
eu ter uma prótese na frente que antes de dormir coloco
num copo d'água. mas não consigo, um minuto sequer, me
esquecer da linda perereca branca como as geleiras do
alaska que, comprada a peso de ouro, pode me dar o conforto
que necessito. sabe como é, burro velho gosta de grama nova.
meio que filosofando, depois de tê-la possuido, apesar do
desconforto que me causará frente aos meus chegados, sorrirei
sem parar pelo bem que ela me fez. sorrirei como os artistas
de cinema e tv, protagonistas, comedores de dentes perfeitos.
ah, pererequinha!, morrerás comigo pois, depois de você,
sorrir será meu castigo. comprarei, será minha, foda-se. o sorriso
será postiço, mas meu. serei apenas mais um no rol dos banguelos.
um piercing nela, talvez... ah, o juca veio me ver pra saber como
estou e me perguntou: 'você sabe quando um animal pra atravessar
um campo está de saída?' hummm!, não -- respondi. 'é quando ele
passa a marca divisória das duas metades' -- completou.
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