projeto uma rua sem saída com meu nome
aonde o ploct-ploct das muletas
perpassa e volteia o coreto
de bonecos risonhos e estáticos
músicos que nas suas estantes
têm os olhares mirando as partituras
de um réquiem tenebroso e sombrio
na minha rua quero os eremitas
os excluídos doentes com suas máscaras naturais
num vaivém teatral sem sentido
uma coreografia manca
desregrada à estupidez da condição racional
rua de prantos inacessível às línguas de aço
marco zero do esgoto fétido
em que os porcos chafurdam
os urubus disputam a carne putrefata
os cães desconjuntados os vômitos
dos transeuntes ruminantes cabisbaixos
enquanto outros de feridas roxas incuráveis
entocados como ratos albinos
escondem-se em casas úmidas
de corredores labirínticos embolorados
amuados como os próprios olhares
como que silenciosamente dissessem:
“mundo não nos veja
apenas aguardamos a morte carnal”
na minha rua, Rua dos Desgraçados
há uma fé silente e inata
nela trafego diuturnamente castigado
pra nunca perder
o que a desgraça individual revela:
sofrer demais e escandalizar-me
já não me basta
basta-me apenas o asco que sinto de mim mesmo
todos Infelizes!
todos Estúpidos!
todos Hipócritas!
todos estereótipos de bom senso!
desconhecem a rua com o meu nome!
notem!
a Rua da Piedade é noutro endereço!
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