terça-feira, 15 de junho de 2010

NOTA DE FALECIMENTO

NOTA DE FALECIMENTO


Tarde de 31/12.
Morreu de ataque fulminante ao ver o amásio baixar
à sepultura.
Pior foi que a parentela ali reunida quis velar o corpo
dela no mesmo instante pra aproveitar o ensejo, pois
ela, em vida, pregava os ditados que diziam: "Não deixe
pra amanhã o que você pode fazer hoje" e "Tempo é
dinheiro".

Em cenas de puro dramalhão mexicano ligaram pra mesma
funerária e ali mesmo foi emitido o atestado de óbito.
Encomendaram outro caixão, outra coroa, etc.  Choraram
a noite toda e repetiram as mesmas preces e hinos de forma
cadenciada e harmonizada face ao treino anterior.

Até a presente data a parentela está em guerra pra saber
quem vai pagar a conta, já que ambos não tinham filhos.
Desenterraram antigas desavenças e palavrões impublicáveis.


Pequeno esclarecimento complementar só por curiosidade.

O ex da falecida achava-se desempregado a vários meses e
curtindo o final de ano numa praia de Fortaleza, aguardando a
contagem regressiva: os últimos 10 segundos do ano velho.
Soube da notícia, em tempo real, pelo celular, dada por um
amigo  que lá no enterro sentiu na pele o ódio que todos sentiam
pelo viúvo recente.

Ficou felicíssimo depois de refletir sobre os bens da burocracia
que o impedira de dar entrada no pedido de divórcio, já que
casara-se em regime de comunhão total de bens.

Meio à queima de fogos, correu até as águas e, por simpatia,
pulou 4 ondinhas com um pedido extraído do fundo do
coração: "Os urubus que paguem as contas" em bis, em tris, etc.
No mais, pensou no seguro de vida, no salário vitalício que
receberia após os trâmites judiciais. Desdenhou das frases
impactantes em repentes machistas que dizia a ex-viva,
tipo: "Nu vim, nu voltarei", afinal ninguém testemunhou mesmo.


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